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terça-feira, 26 de abril de 2011

O trânsito e a Voz do Brasil

A Voz do Brasil não representa todo o Brasil. Pelo menos não o que o povo urbano brasileiro gostaria de ouvir na rádio naquele horário.

O programa vai ao ar todos os dias, descontados os fins de semana, às 19 horas, e dura uma hora. Dividido em quatro partes; 25 minutos de notícias do poder executivo, cinco minutos do judiciário, 10 do Senado e 20 da Câmara dos Deputados. Apesar de algumas modificações ao longo do tempo, o programa existe desde 1935 e se tornou obrigatório durante um período de ditadura e problemas com liberdade de imprensa.

Meu ponto aqui não é tratar das implicações políticas do programa, que já geram muita discussão e embate com as rádios privadas (são concessões públicas, sim, mas são empresas privadas).

O que me incomoda é que para a população urbana a Voz do Brasil nunca foi um prazer nem uma fonte principal de informações. Se é importante o Governo/Estado ter uma voz obrigatória nas rádios nacionais é questão para outra hora, o que não pode é o cidadão que volta para casa do trabalho ser obrigado a uma hora inteira de notícias maçantes. 

De 19h às 20h é uma parte significativa da Hora do Rush nas capitais, momento em que muita gente fica presa no trânsito sem muitas alternativas de distração que não o rádio. Depois de um dia longo de trabalho ou de estudo, chega o momento em que as pessoas querem ouvir uma música ou um programa descontraído, já que os carros e ônibus não andam. 

Poderiam muito bem pegar essas quatro partes e espalhar ao longo do dia, como se fossem várias edições de um mesmo jornal. A Voz do Brasil já está perfeitamente dividida em pedaços tragáveis, só falta o bom senso.

Além de deixar a longa viagem de muita gente mais tranquila, os que ouvem captariam muito mais o que é passado, afinal de contas, hoje em dia dificilmente alguém fica atento a uma hora inteira do quer que seja.

domingo, 24 de abril de 2011

(Des)União Europeia

A União Europeia está em crise, e não é só financeira. De uns tempos pra cá algumas coisas tem anunciado que a comunidade não está mais tão unida assim.

Quando estourou a crise econômica mundial, veio à tona o conhecimento de que nem todos os países estavam confortáveis com a moeda comum e suas consequências, vide Portugal que parece ter sido levado na maré do euro e até agora não conseguiu se adaptar bem à novidade. A Alemanha e a França pressionam o pequeno país para se adequar às normas do mercado e da UE, mesmo que isso no fundo possa acabar de afundar a nação lusa, como defendeu muito bem o sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos, em artigo publicado na Folha de S.Paulo no dia 17 de abril.

Agora o novo front não é econômico - pelo menos não diretamente -, mas sim político. A França fechou suas linhas de trem com a Itália no último domingo, com medo de que os desertores da Tunísia e da Líbia fossem para o país. A Itália teria emitido mais de 20 mil vistos de permanência temporária aos tunisianos, o que deixou toda a comunidade em alerta, pois com estes vistos os imigrantes poderiam circular livremente por 25 países europeus - sendo 22 da UE.

A França já pensa em meios de escapar dos acordos de Schengen - que asseguram a livre circulação - e alguns países se mostram solidários a essa ideia.

É uma pena que as coisas andem nessa direção, mas com a incerteza do euro e uma possível suspensão dos acordos de livre circulação, a União Europeia não parece caminhar para um futuro que faça jus ao seu nome.


domingo, 17 de abril de 2011

Abril Educação - Um monopólio no horizonte

Andam havendo compras e fusões de caráter ao menos curioso no cenário nacional, mas ninguém fala em monopólio. Tudo bem, tudo ao seu momento, mas agora o assunto tocou num ponto um pouco mais delicado: a educação.

A Abril Educação comprou os cursos e colégios pH e 53% do Grupo ETB (Escolas Técnicas do Brasil), que representam, respectivamente, 6.600 alunos no estado do Rio e 2.400 no estado de São  Paulo. Sendo que já detinha os sistemas de ensino Anglo e SER, que reúnem 387 mil alunos em mais de mil escolas pelo Brasil.

Estão interessados em alavancar a educação do país? Seria um motivo bastante nobre, mas acho que há outro dado na conta que pesa mais. Na mesma nota em que o grupo publicou na edição impressa de O Globo de sábado (16/07 - Economia, p. 29), também consta que seu "portfólio de negócios" já incluía as editoras Ática e Scipione, que venderam cerca de 50 milhões de livros em 2010.

É um número e tanto, ainda mais num mercado que se diz em decadência. Mas nem todos sabem que essa dita decadência do mercado editorial não é tão decadente assim quando se fala de livros didáticos, cuja liderança de mercado já é da Abril há alguns anos no Brasil. 

E aos poucos essa liderança deve se consolidar ainda mais, pois alguém que pode controlar o seu público consumidor tem um baita poder na mãos. Basta que todos seus sistemas de ensino indiquem livros das suas editoras. Já dá um número bem considerável de compras, fora a influência que isso gera em todo o mercado editorial. São muitos pontos a se pensar nas consequências. Mas parece que surge uma sombra de monopólio no horizonte.

A educação no Brasil já sofre com muitos problemas complexos e difíceis de se resolver. Um monopólio de mercado nesse momento não seria nem de perto um avanço.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Atenção às mãos chinesas

A China (ou melhor, a empresa taiwanesa Foxconn) vai investir US$ 12 bi aqui. Maravilha, não? Pode ser, mas é muito importante que se dê atenção a todos os envolvidos.

Essa é a mesma empresa que causou repercussão mundial ano passado, acusada de abuso quando funcionários se suicidaram. O líder da companhia, em entrevista ao Wall Street Journal, disse ano passado ainda que os trabalhadores brasileiros têm salários muito altos, e que para o mercado doméstico estava bem, porém para exportar ainda seria difícil competir com a China nos próximos 20 anos.

Tudo bem, a ideia não é exportar, mas sim baratear o produto para o mercado interno. Esse mesmo homem disse que pretende criar 100 mil empregos com o investimento. Será possível? A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) acha improvável, "já que todo o parque da indústria elétrica e eletrônica brasileira emprega 175 mil pessoas", segundo a edição impressa do Globo de hoje.

São muitos números e muito impressionantes, porém é preciso que além de acordos econômicos, também sejam firmados os de respeito e defesa dos trabalhadores. Afinal conhecemos a fama dos chineses quando se trata de condições de trabalho.

O investimento é muito bem vindo, mas que venha de mãos limpas. Sem açoite.

terça-feira, 12 de abril de 2011

O Globo saiu com cara de Meia Hora

É natural que os ânimos se exaltem quando acontece algo como a tragédia da quarta-feira passada (07/04) em Realengo, mas é preciso que se segure a onda na hora de reportar os fatos num meio de comunicação.

Ainda mais quando se trata de um jornal impresso cujo público-alvo são as classes A e B, como O Globo. O jornal de mais prestígio do Rio de Janeiro hoje, que traz nomes de peso e tem uma longa história, deveria fazer uma leitura dos sentimentos da sociedade sim, mas sem necessidade de cair num sensacionalismo barato, que não costuma ser seu padrão.

Como leitor e assinante - além de estudante de jornalismo - me senti mal e surpreso com a capa escolhida para a edição do dia seguinte (08/04) ao triste evento. "Ele atirava na cabeça" eram as palavras que figuravam bem grandes no alto da página, junto a três imagens médias, sendo a primeira de um menino correndo com sangue espalhado pelas roupas e a do meio o assassino com a cabeça ensanguentada numa escada. A reportagem que encabeçava a matéria era toda composta por uma parte da entrevista dada pela menina que aparecia junto à mãe na foto grande. Seguindo bem a linha dos "espreme que sai sangue".

Tudo foi um horror, um atentado ao bem-estar social, de fato. Não há defesa disso e nem é o que se procura. Porém a mídia tem uma força muito grande sobre a sociedade, e é muito importante que saiba dar um tom mais sóbrio quando abordar um assunto tão chocante.

A resposta dos que eu questionei sobre a capa do Globo era: "assim vende mais jornal". Nada mais verdadeiro. E sei da importância de aumentar as tiragens nesse momento de crise do papel e internet crescente. Mas onde está a ética num espaço tão poderoso como aquele, nesse momento crucial? O que está em questão ali, os números à qualquer custo, ou a preocupação com uma informação rigorosa que não desrespeite o cidadão?

Se um jornal se propõe a seguir uma linha e conquista um público com aquele discurso, mudar de rumo no meio do caminho com uma guinada é um erro tremendo. Seja por desrespeito ou por falta de zêlo.

Nem comento o triste fato de alguns apresentadores de TV que foram extremamente inconvenientes levando crianças em momento de trauma para falarem às câmeras. Mas peço mais cuidado aos jornalistas do impresso quando forem escolher suas abordagens. O Globo já tem o Extra e o Expresso para fazerem esse papel. Tem que tomar cuidado para também não sair com a cara do Meia Hora.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Está faltando senso crítico aos juízes

Reclamam da carga horária e pedem aumento salarial.

Lendo rapidamente, qualquer um poderia supor que se tratam de reivindicações feitas por sindicalistas representando trabalhadores que historicamente são vítimas de exploração e de más condições de trabalho. Mas não é exatamente deles que estamos falando agora. As vozes por trás desses fatores são as dos juízes brasileiros.

Seus salários variam de estado para estado, mas a média fica em uns 20 mil reais mensais. Em São Paulo, por exemplo, um juiz de entrância inicial tem salário-base de 19.900 reais, enquanto um de entrância final ganha em torno de 22 mil. O teto é o dos ministros do STF, que está em R$26.723.

Agora o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou um novo horário de trabalho padrão para os homens de toga do país inteiro, que vai de 9h às 18h, mas o magistrado já chia. Ao mesmo tempo em que os juízes federais agendam paralização para o dia 27 de abril, pedindo reajuste salarial de 14,6% (para R$30.675), conforme havia sido decidido pelo mesmo CNJ.

Ganham bastante nossos juízes. E merecem, afinal é uma profissão que envolve muitos riscos. Mas reclamar do horário de 9h às 18h é quase um deboche com a sociedade.

Qualquer cidadão comum empregado trabalha mais ou menos esse horário, quando não mais. E raramente ganham o equivalente à metade de um salário desses. Claro que há uma hierarquia de profissões que entra nessa conta, mas para quem ganha vinte mil ou mais, reclamar de calor quando se tem ar condicionado e pedir aumento além da conta parece um pouco falta de senso crítico num país como o nosso.

E preocupa, quando se trata de quem mais deveria saber julgar as coisas com imparcialidade e consciência.